Uma História de resiliência e sucesso de uma PME moçambicana

7 de maio de 2022

A Salina de Batanhe-Nova Mambone dos Missionários da Consolata, localizada, no distrito de Govuro, província de Inhambane, é, provavelmente, a Pequena e Média Empresa (PME) moçambicana mais resiliente e solidária do país.

Depois de sobreviver aos 16 anos de guerra civil e aos devastadores desastres naturais, o empreendimento reinventou-se e atingiu um notável estágio de desenvolvimento sustentável.

Criada, em 1965, para ajudar no combate contra a fome, que assolava a população de Nova Mambone, a Salina de Batanhe constitui uma referência no desenvolvimento daquela região, onde produz sal de alta qualidade, certificado por análises laboratoriais e apreciado a nível nacional e internacional.

Hoje, o projecto emprega cerca de 40 trabalhadores permanentes, número que ascende a perto de 90, em épocas de safra.

Colhe anualmente entre 5 mil e 5.500 toneladas de sal, resultando num lucro suficiente para garantir o bom funcionamento e continuação da salina, destinado,  igualmente, para a promoção da assistência médica e de aulas de alfabetização aos trabalhadores, assim como para sustentar os missionários e as actividades de evangelização.

Adicionalmente, os rendimentos da salina servem para a promoção do ensino pré-escolar, financiando uma escolinha para a comunidade, onde não existe nenhuma estrutura deste género num raio de cerca de 100 quilómetros do empreendimento.

O seu carácter social foi, igualmente, expresso, quando, em 2015, apoiou a reconstrução da Escola Secundária da Consolata, em Nampula, e financiou a construção de duas salas de aula anexas à Escola Primária de Doane, em Inhambane. Em 2018, apoiou ainda a construção da Escola Primária da Consolata na Cidade de Lichinga, em Niassa.

Segundo contou Padre Carlos José Osório, assessor da Salina de Batanhe-Nova Mambone dos Missionários da Consolata, foi o missionário italiano Padre Amadeu Marchiol que fundou a salina numa planície de terra argilosa, com a intenção de ajudar a missão e o povo daquele recanto de Inhambane, cujo clima adverso, caracterizado por secas cíclicas, impedia o recurso a colheitas agrícolas regulares, propiciando situações de fome.

“O missionário fez o trabalho de construção do projecto, numa pequena área. Desbravou o terreno alagadiço e perseverou no seu sonho”, narrou o assessor da salina.

Através de um longo canal natural, a água do mar da baía de Bartolomeu Dias chegou, pela primeira vez, à planície de Batanhe, depositando nela partículas de cristal, ao ritmo das marés. Assim, o sal do Oceano Índico chegava àquela região improvável.

Reerguer-se da cinza

Com o decurso do tempo, a guerra civil intensificou-se na região, levando o missionário a se refugiar na cidade da Beira, deixando a salina com um grupo de trabalhadores, para garantir a continuidade do processo produtivo.

Nos anos oitenta, ainda em plena guerra, as estradas ficaram intransitáveis, impedindo o escoamento do sal. Deste modo, o contrato que a salina tinha, visando a exportação de sal para o Zimbabwe, foi cancelado, levando à paralisação do empreendimento, que viria a ser retomado em 1992, com o advento da paz.

Quando tudo indicava que tinha chegado a hora da bonança, eis que uma nova contrariedade surgiu, em 2000: “um violento ciclone devastou a região de Mambone, causando cheias, que não pouparam quase nada, incluindo a salina”, lembrou Padre Carlos José Osório.

Em consequência da intempérie, a salina perdeu cerca de três mil toneladas de sal que tinham sido depositadas nos seus armazéns e destruiu os mesmos. Parecia, mais uma vez, que tinha chegado o fim de um projecto social: “Mas com o espírito de resiliência, o missionário Padre Amadeu Marchiol, conseguiu recompor a salina, reiniciando o ciclo produtivo, dez anos após a dramática situação, que se abateu sobre ela”, explicou.

O período subsequente, segundo realçou o assessor da salina, serviu para reorganizar a terra e a criação de melhores condições para os trabalhadores, bem como a modernização da própria salina, incluindo o processo de extracção, limpeza e embalamento do sal.

Uma vez retomado o curso normal de produção, o projecto abriu, em 2013, novas áreas de negócio, passando a extrair a flor de sal, um produto que resulta dos primeiros cristais de sal que se formam e permanecem à superfície das salinas.

“Trata-se de uma fonte natural de ferro, zinco, magnésio, iodo, flúor, sódio, cálcio, potássio e cobre. A flor de sal é um produto artesanal raro devido à sua produção limitada aos meses mais quentes”, explicou o Padre Carlos José Osório.

 

Prémios legitimam esforço e criatividade

Reconhecido e apreciado a nível nacional e internacional, o sal de Mambone é comercializado no interior do país, sendo que agora se prepara para dar os primeiros passos para conquistar o mercado africano.

“Procuramos gerar mais riqueza a partir de Moçambique e para Moçambique. Para isso, pretendemos ampliar a área de exploração e, consequentemente, aumentar a capacidade extractiva da salina”, disse o Padre Carlos José Osório.

O esforço empreendido pela salina no domínio da inovação e melhoria da qualidade já lhe valeu vários prémios, sendo de destacar a distinção obtida, nas áreas da inclusão e do agro-negócio em 2017 e o prémio Agro Empreendedor, em 2018.

A distinção, referente à inclusão e agro-negócio, foi obtida na quinta edição do prémio 100 Melhores Pequenas e Médias Empresas de Moçambique (PME), uma iniciativa conjunta do Ministério da Indústria e Comércio e um grupo empresarial de comunicação. Este prémio resultou da forma como a Salina de Batanhe se reinventou para se aproximar aos clientes e assegurar um espaço no mercado nacional.

Em 2019, a salina venceu o prémio de melhor produto manufaturado, atribuído na Feira Internacional de Maputo.